20.2.11

Gases em Bebês

Tanto os bebês como os adultos podem ter gases no estômago ou no intestino (sobretudo no intestino grosso). Mas são duas questões completamente diferentes.

O gás encontrado no estômago é ar, ar normal e corrente que o indivíduo engoliu (é o que os médicos chamam aerofagia, engolir ar). Os bebês podem engolir ar ao se alimentar, ou ao chorar, também quando chupam dedo ou chupeta.
O gás que está no intestino é diferente, basta cheirá-lo para perceber. Contém nitrogênio do ar deglutido (o oxigênio foi absorvido pelo tubo digestivo) e gases que são produzidos no próprio intestino pela digestão de certos alimentos e que dão seu odor característico.
Quando um bebê engole muito ar, seria possível que soltasse muito “pum”, porém é mais fácil que o excesso saia por cima, com arrotos. Um excesso de gases no intestino é mais provável que seja proveniente da digestão que do ar deglutido.

Quando o bebê não mama corretamente, porque está com a pega errada ou tem outra dificuldade, é possível que tome muita lactose e pouca gordura e a sobrecarga de lactose pode produzir um excesso de gases. Além disso, por estar com a pega errada, é provável que engula ar enquanto mama. Mas nem a pega incorreta é a principal causa dos gases, nem os gases são o principal sintoma da pega incorreta.
Os gases em excesso no intestino só podem ser eliminados sob a forma de “pum” . Por sorte, não podem fazer o caminho inverso e sair pela boca.
 
É mais fácil eliminar o ar do estômago (quer dizer, arrotar) em posição vertical que em posição horizontal. Como nossos antepassados estavam sempre no colo de suas mães, em posição mais ou menos vertical, não deviam ter muito problema. No século passado o uso das mamadeiras e dos berços ficou generalizado. Com a mamadeira, o bebê pode engolir muito ar, e no berço é difícil soltá-lo; por isso parecia importante colocar o bebê para arrotar antes de colocá-lo no berço.
Contudo, não parece que os gases incomodam os bebês, salvo em casos extremos. Muita gente pensa que a principal causa do choro em bebês pequenos seja os gases; e muitos dos medicamentos que ao longo do tempo se tem recomendado para a cólica do lactente se supunha que ajudavam a expulsá-los (esse é o significado da palavra carminativo), ou para evitar a formação de bolhas (nunca entendi o porquê, mas sim, algumas gotas para cólicas são antiespumantes).
 
Nem todos estão de acordo com a causa das cólicas (mais adiante explicarei minha teoria favorita), mas parece que não restam mais defensores sérios da teoria dos gases. Há muitos anos, quando não se sabia que o excesso de raio x era maléfico e se faziam radiografias por qualquer bobagem, alguém teve a idéia de fazer radiografias dos bebês que choravam (o gás é visto perfeitamente como uma grande mancha negra na radiografia).

Comprovou-se que os bebês têm poucos gases quando começam a chorar, porém muitos gases quando levam um tempo chorando. O que ocorre é que engolem ar ao chorar, e como não podem chorar e arrotar ao mesmo tempo, vão acumulando gases até que param de chorar.

A mãe costuma explicar assim: “Pobrezinho, estava chorando muito porque estava cheio de gases. Peguei, dei uns tapinhas, ele, conseguiu arrotar e melhorou”. Na realidade, a interpretação correta seria: “Pobrezinho, chorava porque estava com saudade de mim. Quando peguei ele no colo e fiz carinho, ele se tranquilizou e deu um arroto enorme com todo o ar que tinha engolido enquanto chorava”.
Acho que isso explica a importância do arroto no século passado. Quando a mãe tentava colocar o bebê no berço logo após acabar de mamar, o bebê chorava desesperado. Em vez disso, se ficasse com ele no colo e o embalasse um pouco antes de colocá-lo no berço, era mais fácil que o bebê se traquilizasse e dormisse.
 
Durante esse tempo que estava nos braços, claro, o bebê arrotava. E como ninguém queria reconhecer que o colo da mãe era bom para o bebê (como vai ser bom? O colo da mãe é mau, estraga, o bebê não tem que ficar no colo, ou ficará manhoso!), preferiram pensar que era o arroto, e não a presença da mãe, que havia feito o milagre.
 
A verdade é que muitas mães modernas têm a ideia de que o arroto é importantíssimo, fundamental para a saúde e bem estar do seu filho. Tem que arrotar custe o que custar. Mas os bebês amamentados, se mamaram corretamente, não engolem quase nada de ar (os lábios se fecham hermeticamente sobre o peito, razão pelo qual o ar não entra; e dentro do peito não tem ar, ao contrário da mamadeira).

Muitas vezes, os bebês de peito não arrotam depois de mamar. Por outro lado, quando estão com a pega errada, é possível que engulam ar, fazendo um barulho como de beijinhos, porque fica uma frestinha entre os lábios e o peito.

Uma vez uma mãe me explicou que seu filho custa a arrotar, que tem de ficar uma hora dando tapinhas nas costas, que ele chora, inclusive,de tão mal que fica, até que por fim pode eliminar os gases. Pobre criatura, o que acontece é que não tem gases para eliminar; chora de tantos tapinhas e voltas que dão com ele, e ao final elimina o ar que engoliu enquanto chorava.
Não fique obsessiva com o arroto. Depois de mamar, é uma boa ideia deixar o bebê por um tempo no colo. Isso ele vai gostar. Se nesse tempo eliminar os gases, está bem. E se não, pode ser que não tenha gases. Não lhe dê tapinhas nas costas, não lhe dê camomila, nem erva-doce, nem água, nem nenhum remédio para gases (nem natural nem artificial, nem alopático nem fitoterápico, nem comprado, nem o que tenha em casa).

Do livro Um regalo para toda la vida- Guía de la lactancia materna, de Carlos González
Tradução: Fernanda Mainie
Revisão: Luciana Freitas
Comunidade Grupo Virtual de Amamentação

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