Sexualidade na Gestação: Mitos e Tabus
A mulher grávida e o homem mudam sua forma de ser e de se comportar segundo a sua personalidade, inteligência, cultura, sobretudo em concordância com o desejo ou não da gravidez. Esta é um período de transição cultural, social e econômica que pode influenciar na vida familiar do casal.
Determinados mitos e tabus são vivenciados e dúvidas surgem nesse período, fazendo-se necessário através da educação desmitificá-lo, principalmente no que se refere às questões físicas, emocionais e sexuais. Tanto homem quanto mulher não perdem o desejo sexual durante os nove meses da gravidez.
Visto que a gestação, em determinados momentos, pode simular uma situação de crise, afetando o elo sexual e conjugal, tem-se a opção de recorrer a soluções emergenciais na tentativa de quebrar situações inadequadas do passado. Para o casal, solicitar apoio psicoterápico, ou a terapia sexual, representará um importante passo no desenvolvimento dos indivíduos, promovendo um crescente ajustamento emocional.
A VIVÊNCIA SEXUAL NA GESTAÇÃO
Para o casal a gestação é um período de adaptações em todos os sentidos - físico, emocional, existencial e também sexual. É importante frisar que esses não só afetam a mulher, mas também o homem; também, faz-se necessário dizer que a sexualidade, durante essa fase, sofre algumas mudanças, pois, a partir do momento em que a mulher entra no período gestacional, iniciará um processo de desenvolvimento que conduzirá a várias transformações orgânicas expressivas em nível biopsicossocial
Portanto, ficam claras as contundentes alterações físicas que acontecem nesse período, como: crescimento abdominal, sensibilidade mamária, maior lubrificação vaginal, vômitos e náuseas (em alguns casos), entre outros. Todas essas alterações orgânicas podem influenciar fortemente no relacionamento do casal, pois geram desconforto.
Segundo Suplicy (1993), à medida que a gravidez avança, e a barriga da mãe cresce, o casal tem que experimentar posições mais confortáveis. Adaptando as novas posições, pode tornar gratificante o sexo.
A sexualidade dependerá, entre outros motivos, de como a gestante se percebe, se avalia e se valoriza nessa fase. Alguns fatores podem influenciar no desempenho sexual masculino, um deles é a estética da mulher. Dependendo da preferência do companheiro, as alterações na estética corporal da mulher servem como desestímulo à sua libido.
Muito embora por amor e respeito algo possa ser dito em sentido contrário, na realidade, a perda de atrativos sexuais da mulher, que passa a não corresponder ao modelo social de “sexualmente atraente”, é importante fator negativo sobre o desempenho sexual masculino.
A atividade sexual durante a gestação é bastante importante. Nem o homem nem a mulher perdem o desejo sexual durante os nove meses de gravidez. Quanto ao desejo sexual na gestação, algumas mulheres permanecem com a libido normal; outras se referem a uma diminuição na freqüência das atividades sexuais no início e no final da gravidez em decorrência de desconfortos.
Desse modo, há acordo em que a freqüência coital diminui no primeiro trimestre, mantém-se praticamente no mesmo nível durante o segundo e diminui mais no terceiro, no entanto, pouco mais da metade das grávidas mantém relacionamento sexual duas a três vezes por semana até o início do terceiro trimestre, e mais da metade abstém-se três a seis semanas antes do parto.
Caso ocorra a inexistência sexual durante a gestação poderá surgir uma frustração por parte daquele que não tomou esse posicionamento, podendo trazer prejuízo para o bom relacionamento afetivo do casal frente às adversidades geradas dentro do período gestacional.
Suplicy (1993) afirma que muitos homens se sentem enciumados ou abandonados com a gravidez, e a sensação de exclusão pode ser aumentada se existir uma menor atividade sexual.
Culturalmente existe idéia de diminuição da freqüência sexual na gestação, surgem comentários negativos, a exemplo de: “Na gravidez é assim mesmo...”. Dessa forma os casais passam a acreditar que o exercício da sexualidade não condiz com a maternidade.
Isso é um problema, uma vez que a mulher está carente, tem a necessidade de sentir-se amparada e querida, seus sentimentos estão à flor da pele. A relação sexual contribui para seu bem-estar; caso contrário podem surgir conflitos. Outro fator é quando o parceiro passa a confundir maternidade com santidade, excluindo a sexualidade da vida do casal.
Comportamentos e acontecimentos frente à gestação
O ser humano, por intermédio das mudanças diárias, da desorganização momentânea dos seus referenciais, de certa forma é acometido por eventualidades estressantes. Muitas vezes, essas transformações vêm sob a configuração de crises existenciais que se tomam por decisões sem retorno na vida de uma pessoa. Trata-se de “deixar de ser” para “passar a ser”.
“O impacto emocional conseqüente, se adequadamente aceito e incorporado, implicará necessariamente crescimento e desenvolvimento nos planos mental, emocional e espiritual, isto e, na transformação pessoal”. (TEDESCO, 1999, p.267).
A gravidez, dessa forma, caracteriza-se por ter duas vertentes distintas - uma é o conteúdo prévio (vivências anteriores, acumuladas desde a vida intra-uterina); o outro é o atual (específico do estado gravídico e ambiental). O primeiro é a história individual de cada pessoa, a sua personalidade, sua forma de ser e estar no mundo. A partir daí, estabelecem-se diferentes formas de ser sentir, agir, frente aos fatos diários de cada um.
Torna-se possível entender que a gravidez, com tudo que esse estado possa representar, é percebida e sentida de modo diferente por mulheres de pensamentos lógicos, racional concreto, e por outras, de pensamento abstrato, idealizado transcendental. O segundo conteúdos intrapsíquicos atuais, deriva da vida relacional da grávida, isto é, do contato com a família, com o meio social, com o trabalho.
No primeiro trimestre da gravidez geralmente ocorre confirmação ou diagnóstico, inicia-se a regressão, representação inconsciente do narcisismo primário e decorre da percepção, ainda não consciente das mudanças hormonais e orgânicas que se iniciam aliada ao desconhecido do seu significado.
Conseqüentemente, a mulher utiliza o mecanismo de defesa para afastar os estímulos internos e externos, retraindo-se em busca de conhecimentos literários, tendo bastante sonolência. Esses movimentos são percebidos por maridos, familiares, filhos e amigos.
Para Maldonado (1997) é a partir do momento da percepção da gravidez que se iniciam a formação da relação materno-filial e as modificações na rede de intercomunicação familiar. É nesse momento também que se instala a vivência básica da gestação, a qual vai se manifestar sob diversas formas no decorrer dos três trimestres e após o parto.
A ambivalência é comum na gestação podendo ser consciente e inconsciente. Neste contexto, a importância de se falar da gravidez desejada e indesejada, passível de ocorrer com qualquer pessoa, não significa que ela não é desejada no momento, não significa dizer que a mãe ou o pai estejam rejeitando o feto, mas sim o estado gravídico e todas as suas implicações.
Essa ambigüidade é representada pelo surgimento dos vômitos, náuseas, constipação ou diarréia, cuja causa é desconhecida; porém, esses fenômenos são universais e acontecem de forma e intensidade diferente nas mulheres. É pertinente a hipótese dos mecanismos psíquicos junto aos orgânicos. Nos psíquicos, destaca-se o inconsciente da “mãe má” que aparece nas alterações intestinais. É importante lembrar que o vômito é a representação inconsciente do estado gravídico.
O segundo trimestre caracteriza-se pela fase de aquietação, percepção dos movimentos fetais e do crescimento uterino. Os movimentos fetais, presentes desde o início, ocorrem visivelmente durante a 20ª semana. Esse período é bastante delicado, pois ocorrem alterações emocionais, a grávida sente o feto como sua extensão e ao perceber o movimento ocorre uma separação. Ela passa a senti-lo separadamente, o nutrindo-o e protegendo-o.
Já no processo de crescimento uterino, a gestação fica clara devido às mudanças corporais, diminuição da freqüência das micções, dos enjôos e vômitos, consequentemente, melhora sua disposição sexual, atingindo o orgasmo mais facilmente.
No terceiro trimestre aproxima-se do parto. Pode haver ansiedade, começam a surgir pensamentos pessimistas sobre o parto, preocupação com a saúde da criança, medo de como irá desempenhar seu papel materno, mudança de rotina.
Clinicamente, surgem queixas de cansaço, fadiga, insônia, contrações uterinas presentes aumentadas, desequilíbrio, tontura, aumenta a incidência de câimbras que equivalem a fatores orgânicos. Durante esses períodos paralelamente, podem ser analisados dois componentes: a motivação referente à gestação e a ligação com o filho.
No componente motivação, existe toda uma feminilidade, um instinto maternal, normalidade biológica, o desejo de satisfazer o parceiro, manter um relacionamento, a inveja dos estímulos socioculturais, a pressão dos familiares próximos.
O vínculo com o filho tem início após a movimentação. Já acontece a idealização de sua imagem, havendo assim cinco identificações: desejo de conhecer, ficar junto, evitar perda ou separação, proteger e suprir necessidades que irão condicionar comportamentos de informação, aproximação, proteção, gratificação altruísta e prazer. Quanto mais contatos com esses tipos de necessidades, mais haverá disposição e mais profunda será a ligação com o filho, favorecendo a boa evolução da gravidez.
No que diz respeito à vida social da grávida e ao relacionamento com outras colegas, ou em reuniões sociais, ocasionalmente fala-se acerca da gestação. Fatos negativos vêm à tona, deixando-a com receio, medos e até pavor.
A gestante, como todos, está sujeita aos eventos estressantes de vida e de morte, o que fará diferença é a maneira como irá reagir frente às eventuais situações, dependendo da sua estrutura emocional e psicológica atuais.
Portanto não deixa de ser um período de transição, recheado de alegrias e tristezas. A mulher que dará a luz jamais será a mesma de quando não tinha filhos; agora assumirá novos papéis e uma nova etapa surgirá, acontecerá uma nova família.
Aspectos psicológicos enfrentados na gestação
A mulher grávida muda sua forma de ser e de se comportar segundo sua personalidade, inteligência, cultura, mesmo tratando-se de uma gravidez desejada ou não.
Muitas mulheres reassentem de forma dramática chegando a ter depressão quando descobrem que estão grávidas; outras aceitam prazerosamente, sentindo-se eufóricas, contentes e alegres, provavelmente porque a gravidez e a maternidade constituem os dois aspectos psicofisiológicos básicos em que a mulher se realiza como tal - um é a mudança física e emocional e o outro é o crescimento do feto no útero.
Segundo Maldonado (1997) a gravidez é uma transição normal que faz parte do processo do desenvolvimento, quando acontece a reestruturação e o reajustamento em várias dimensões: mudança de identidade e definições de papéis. A mulher passa a se olhar e a ser olhada de maneira diferente.
A gestação constitui uma situação psicológica e fisiológica muito singular que supõe duas adaptações especiais na mulher. Em primeiro lugar, aceitação da gravidez ao se de se acostumar com a idéia de ser mãe, podendo acontecer, com a descoberta, de experimentar sentimentos de repulsa, alegria, tristeza, indiferença, desespero e não aceitação.
Em qualquer caso, a gravidez é acompanhada inevitavelmente de uma série de mudanças emocionais importantes, provavelmente por supor uma instabilidade e vulnerabilidade a problemas psicológicos diversos.
Na aceitação influem muitos fatores, desde mudanças em suas comodidades familiares até questões mais sérias de ordem emocional, afetiva com o cônjuge, nível sócio-econômico, residência, apoio familiar e social, trabalho entre outros.
Uma vez que a mãe passa a aceitar a gestação, passa a identificar o feto como parte integrante de si mesma. Em seguida, ela tem que identificá-lo à parte, passando a conscientizar-se de que ele é um individuo com vida própria, principalmente durante os “pontapés”, isto é, a sensação dos movimentos fetais, quando a mãe começa a se comunicar e o bebê corresponde; a mãe apalpa e toca com carinho e ele retribui com os movimentos chutando a mãe. Esta começa a falar com ele, a dizer-lhe que será um jogador de futebol ou um boxeador.
De certa forma, está contribuindo para com a formação de sua personalidade, desenvolvendo, também sentimentos de “apego” para com o seu bebê. Surge, assim, um melhor entrosamento com a gestação, aceitando melhor esse período, desenvolvendo atividades, realizando planos para o seu filho, voltando-se exclusivamente para ele.
Maldonado (1997) afirma que as interpretações dos movimentos fetais podem ser colocadas dentro de um contínuo geral de despersonificação-personificação. Muitas mulheres jamais conseguem sentir e diferenciar o feto; outras conseguem, com nitidez, perceber a posição dos membros e tronco, à medida que a gravidez avança.
Essa ambivalência pode ser manifestada pelo alívio de sentir os movimentos, sinal de que o feto está vivo, e ansiedade quando não detecta os movimentos, surgindo medo de que algo não vai bem. A interpretação dos movimentos fetais constitui mais uma etapa da formação relação materno-filial em que na fantasia da mãe, o feto passa a adquirir características próprias e a se “comunicar” com ela através dos seus movimentos.
Pode ser que, então, a futura mamãe comece a aceitar melhor sua gestação e desenvolva uma intensa atividade, fazendo planos para o seu filho, preparando-lhe a roupa, quarto, berço, entre outros. A grávida volta-se emocional e sentimentalmente para o feto.
Mas, ao mesmo tempo, começam a surgir temores, preocupação, inseguranças. Meu filho será normal? Terá algum defeito? Essas e outras muitas perguntas acerca do futuro do seu filho fazem surgir debilidades internas de forma inconsciente que originarão uma fonte contínua de conflitos e, portanto, de ansiedade, dando lugar aos tipos de transtornos emocionais da mulher grávida (tristeza, depressão, irritabilidade, agressividade, intolerância, frustração, etc.).
O pai deverá fazer parte integrante, “apegar-se” à estrutura que compõe mãe e filho. No entanto, existem situações que podem vir para prejudicar esse equilíbrio psicológico da mãe gestante, tais como: stress, mudanças de domicílio, infidelidade matrimonial, morte de um ser querido (pai, mãe, irmãos, marido, etc.), privações econômicas, falecimento de uma criança pequenina, desemprego, solidão, diminuição do apoio social e afetivo.
O estado grávido puerperal não é sinônimo de doença e sim uma condição psicológica especial da mulher. Por isso, são removidos os equilíbrios adquiridos e podem surgir descompensações importantes. A evolução psicológica da gravidez depende da forma na qual se realize a identificação “mãe-criança”, podendo aparecer uma autêntica fusão psíquica.
Andréa Lúcia G. C. T. Flores al-flores@hotmail.com
Graduanda em Psicologia
Centro de Estudos Superiores de Maceió/ CESMAC
Vera Christina de Oliveira Amorim verac.amorim@cesmac.com.br
Docente da Faculdade de Ciências Humanas do CESMAC e orientadora de TCC do Curso de Psicologia
Revista Científica de Psicologia
Coordenação Pedagógica do Curso de Psicologia do CESMAC
Maceió - Alagoas - Brasil
Revista Eletrônica de Psicologia
Ano I Número 1
Julho de 2007
Periodicidade: Semestral
Fonte: http://www.amigasdoparto.org.br/2007/index.php?option=com_content&task=view&id=1086&Itemid=208
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